Um tribunal em Luanda, capital de Angola, absolveu hoje o jornalista de investigação Rafael Marques e o editor Mariano Brás por acusações de insulto ao Estado, o que representa uma grande vitória para a liberdade de imprensa num país onde a comunicação social tem sido alvo de repressão por parte do governo.
Os dois jornalistas foram acusados em 21 de junho de 2017 de “ultraje ao órgão de soberania e injúria ao poder público”, ao abrigo da Lei dos Crimes contra a Segurança do Estado, no seguimento da publicação de um artigo sobre a aquisição alegadamente ilícita de um terreno na qual o Procurador-geral da República, João Maria de Sousa, esteve envolvido.
O artigo ̶ inicialmente publicado em novembro de 2016 no site de Rafael Marques, MakaAngola, e retomado por Mariano Brás na sua publicação, O Crime ̶ alegava que João Maria de Sousa agira ilicitamente como promotor imobiliário, excedendo as suas funções oficiais. Também sugeria que o ex-presidente, José Eduardo dos Santos, apoiara as ações do Procurador-geral.
Os magistrados do Ministério Público argumentaram que os jornalistas agiram de má-fé e que violaram os princípios éticos do jornalismo. No entanto, a juíza discordou.
Na leitura da sentença, que se prolongou durante quase três horas, a juíza Josina Ferreira Falcão ressalvou a importância de sujeitar os funcionários públicos à crítica e ao escrutínio. "Este tribunal acredita que, enquanto sociedade que deseja evoluir, estaremos a ter um mau desempenho se punirmos os portadores de más notícias", disse.
A decisão inesperada representa uma vitória para a liberdade de imprensa num país onde a comunicação está sujeita a um apertado controlo e em que é frequente as autoridades reprimirem a cobertura de casos de corrupção que envolvem funcionários do governo, por meio de intimidação e do uso abusivo da legislação em matéria de difamação.
Em 23 de janeiro de 2017, o então presidente José Eduardo dos Santos promulgou a Lei de Imprensa, que limita a liberdade de expressão, apesar da oposição dos sindicatos e grupos de direitos dos jornalistas. O Sindicato dos Jornalistas Angolanos disse que a lei é “uma ferramenta política para intimidar a imprensa”.
Na sequência da decisão judicial histórica de hoje, o governo angolano deve ir mais longe e alterar a lei de 2017 para que os jornalistas possam fazer o seu trabalho num ambiente livre.